Quando a noite segue o dia é o
crepúsculo que se esgota nas paredes brancas. E faz descer na calçada cinzenta
uma luz que se apaga lentamente. Como outrora faziam os candeeiros a petróleo. E
as velas que ardiam até ao fim, também.
A rotina repete-se crepúsculo
após crepúsculo. E raramente damos conta do hábito que nos molda. Que nos transfigura,
como figuras únicas. Egocêntricas. Sem a preocupação de conhecer o que rodeia o
corpo. Sem olhar as casas na cidade. Sem caminhar nas ruas da comunidade.
Há uma resignação que tem o
tamanho da existência. Que se esconde, bem escondida, na rejeição da certeza. É
a desculpa. E é essa a fragilidade que nos leva o espirito. Que não servindo
para mais nada é a justificação para os silêncios. Para a inércia.
Falta-nos o sentido da comunidade.
O envolvimento recíproco. Assim como falta o ar nas tardes quentes de Verão. Quando
respiramos aos poucos. Pouco de cada vez. E o espirito adormece. Perde-se nas
conversas fúteis que desviam as atenções. Esgota-se na injustiça da
culpabilização dos outros.
E assim vamos construindo o nós! Em plural pequeno. Apenas formal.
Que renúncia à história. Sem identidade. Assim como o crepúsculo queima a luz
na calçada cinzenta também nós perdemos a oportunidade. Sem consciência. E essa
falta de consciência faz-nos ignorar a predestinação. Desejar mais. Mover
forças e vontades. Encontrar caminhos comuns. Construir pelo que nos une: a
cidade, que somos nós também!
E a cidade precisa de pensamento.
De divergência. Da contrariedade. Como o dia se opõe à noite, genuinamente. E precisa
de nós. Das diferenças. Do futuro que renasce pelo crepúsculo matinal. Sem preconceito.
Precisa! E nós também! De orgulho.
Sim, de orgulho. Sentimento que nos une, recrutando olhares brilhantes e peitos
cheios. Como uma honra, um privilégio que encoraja os cidadãos.
Falta-nos esse
brio. E precisamos dele para seguir em frente. Para abrir os campos na cidade. Estender
as casas e as ruas. Enche-las de gente com risos e vozes. Destapar janelas e
amanhãs.
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